"Fiu-fiu", "Ô lá em
casa", "delícia", "ah se fosse minha"… qual corredora ou triatleta nunca teve o
desprazer de ouvir "isso" (porque para mim nem cantada é…), ou as buzinadas
(daquelas que te tiram até do rumo) durante seus treinos nas ruas ou estradas?
É chato, é constrangedor, é vexatório.
Na verdade, é vergonha maior para
quem faz, pois fica parecendo um ridículo e idiota berrando comentários
inapropriados para fora da janela do seu carro.
Alguns pior ainda, com filhos junto. Desrespeitar
mulher (tanto a que está na rua quanto a que eles tem dentro de casa) já é
desprezível mas desrespeitar a presença de filhos e, pior, dar tamanho mau
exemplo é o fundo do poço.
Algumas situações como arremesso de
latas, lixo, tapetadas nas costas, tirar "finas", são comuns para quem corre
por aí e, mais ainda, pedala nas estradas. É falta de educação? Sim. E mais
ainda, é violência gratuita contra quem está praticando uma atividade física
sem incomodar ninguém.
Entretanto, está se tornando mais
comum do que poderia se imaginar a violência com a conotação sexual, isto é, as
famosas "passadas de mão" e "tapas" em corredoras e ciclistas.
Enquanto estamos correndo, podemos (e devemos) fazer nosso treino
"contra-fluxo", a fim de termos mais segurança. Porém nos treinos de bike,
obrigatoriamente temos que seguir o fluxo e então ficamos a mercê de quem vem
atrás.
Alguns, inclusive, invadem o acostamento para agredirem.
Há muitos anos, quando comecei a
treinar corrida pelas ruas da cidade tive o desprazer de vivenciar uma agressão
dessas, quando um cara de bicicleta, que vinha pela calçada, me deu um tapão na
bunda. Foi o que bastou para desde então ficar super hiper alerta e correr
SEMPRE no contra-fluxo, inclusive quando estou nas calçadas.
Então alguém pode dizer: "ah corre na
calçada ou parque e pedala na ciclovia". Pois bem, gente sem bom-senso tem em
todo lugar. Há algum tempo li no grupo de corredores de Curitiba o desabafo de
uma corredora (infelizmente perdi a publicação e não lembro o nome dela) que
foi assediada enquanto corria na ciclovia/pista da Arthur Bernardes – lugar
comum e conhecido para correr em Curitiba – por um cidadão que estava de
bicicleta. Ela ouviu palavras BEM OBSCENAS do "tarado da ciclovia" e depois da
sua divulgação outras mulheres afirmaram tê-lo visto e com o mesmo
comportamento.
Não é porque sutiãs foram queimados
há séculos atrás que tudo ficou permitido. O respeito não foi jogado na mesma
fogueira. Queremos treinar em paz, sem termos
que usar uma burca. Há quem cometa excessos? Sim. Mas a grande maioria só quer
usar bermuda, camiseta, shorts…desde quando isso ficou proibido para
correr/pedalar? É vestimenta de treino, compatível com a modalidade. Ninguém
está pedindo para ser assediada por doentes. Aliás, para doença há tratamento;
para animal, jaula; e para bandido, B.O.
Vivemos em uma sociedade machista,
sim. Como demonstrado em um artigo de Nádia Lapa, na Carta Capital, 83% das
mulheres não gostam de assédio nas ruas – incluindo as cantadas.
"Alguma mulher já saiu correndo atrás
do motorista de um carro qualquer que buzinou para ela ou fez comentários sobre
alguma parte do corpo dela, constrangendo-a publicamente?
Isso
é, na verdade, controle e poder – e o lembrete de que o lugar de mulher é na
vida doméstica. Não ocupe espaços públicos, porque lá você será
assediada/agredida/constrangida."
Óbvio, não vamos generalizar. A
maioria dos homens ainda respeita e graças a isso, sabemos que é uma minoria
doente e cafajeste que esquece que tem mãe, esposa, irmã ou filha em casa e
agride – moral e fisicamente – as mulheres nas ruas.
Antes de dizerem "ah mas isso não
acontece só com as mulheres. Você tá defendendo a classe". Sim, defendo outras
atletas que passam pelo mesmo problema em treinos. Mas se isso também ocorre
com os rapazes, contem pra gente!! Eu, confesso, já ouvi relatos de violência –
tapetadas, arremesso de latas e bitucas, pauladas – mas não sexual. Posso estar
desinformada e eis aqui um espaço para vocês comentarem e trocarem
experiências!
Conviver com a insegurança já é
hábito para nós, brasileiros. Entretanto quando a violência ultrapassa o âmbito
da segurança e viola nossa intimidade, é o pior. Mulher gosta de ser cortejada,
paquerada mas no local e momento certo, de maneira respeitosa e por quem elas
dão liberdade.
Não, este post não é um manifesto
feminista (nada contra elas!!!). É um desabafo sobre respeito. Não é com
"passadas de mão", tapas e fiu-fiu’s em treinos que as atletas serão felizes.
Muito pelo contrário.
(Este post foi publicado originalmente pela autora na coluna IMpossível, do site Papo de Esteira, em 30/09/13 - http://www.papodeesteira.com.br/blogs/im-possivel/direito-treinar-burca/ )
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